quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Descoberta

E sabe qual foi o meu erro, todo o meu engano? Me deixar levar por esse sorriso tímido e besta, as mãos cobrindo uma parte do rosto enquanto falava qualquer coisa. Devia ser pra não levantar suspeitas.

Deixei. Deixei as noites, deixei boemia, deixei de ficar bêbada pelas madrugadas, de fumar um cigarro aqui e outro ali. Recusei convites irrecusáveis. Tudo o que me fazia eu, tudo o que era do meu gosto. Tantas mãos e camas que por uma noite iam me fazer completamente realizada, mesmo que no outro dia eu vestisse minhas roupas e tivesse de ir embora sem olhar pra trás.

E era tudo uma imunda máscara, não era? Uma máscara que só deixava de verdadeiro da tua face do lado de fora esses olhos de amêndoa que eu não cansava de olhar. E ficava hipinoticamente doente, então.

Ah, se eu soubesse. Se eu soubesse que eras essa medusa, não teria passado nem perto pra não correr o risco de sentir o cheiro da tua pele e querer provar.

Virei uma boneca de pedra, enfeitiçada. Por anos, escrava das tuas vontades, cachorra vadia e sem orgulho. Até descobrir uma a uma as flores que murchaste. E eu era uma entre elas, já quase sem vida.

Quer saber do que mais? Agora foda-se.

Cortei tua cabeça e matei as tuas cobras.

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Amélia

Era perfeita, não tinha um defeito se quer, podia procurar. Que procurasse em todos os cantinhos, em cada característica.
Corpo perfeito, rosto lindo, voz de boneca, cabelos incríveis que, apesar dela não gostar dos pequenos cachos que formavam, não saiam do lugar.
Abdicava das amigas, dos amigos, da família.
Falava baixo, concordava com tudo, tinha sempre a opinião dele na boca, não importando quem fosse o ele da vez.
Cozinhava bem e colocava o almoço dele no prato sempre na hora certinha que ele havia estipulado para comer.
Limpava a casa, cuidava dos bichos, cuidava de tudo sem reclamar, cuidava de tudo como uma grega esperando o marido voltar da guerra.
Na cama, a preferência era o que ele quisesse que fosse. Se ele mandava, devia ser bom.
Tantos e tantos pretendentes na porta, tantos elogios, tantas propostas... Era perfeita, mas era mulher de um homem só.
(mesmo que ele já fosse casado).

sábado, 3 de dezembro de 2011

Pontos e nós

Disse - premeditadamente - que não falasse sobre aquele assunto, em meio a outras frases, como quem não pede nada de importante.
Aí foi, e tocou nele de novo (e eu sabia que tocaria).
Agi diferente, também foi pensado.
Repeti que não falasse mais...
Desapareci.
Me mandou uma mensagem perguntando o que eu tinha. Ainda pensei em responder "safadeza no sangue. E muita."
Mas preferi ficar calada pra deixar um ar de mistério. Também premeditado.


sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Você vai tirar um cochilo entediada da vida e quando, acorda tem aquele estalo e se dá conta que não tem mais ligação nenhuma com a pessoa, mesmo estando debaixo de um morro de promessas, de novas tentativas e tantas juras de que ainda existe amor ali depois de todo aquele desgaste. "Vamos, vamos tentar de novo, ainda te amo, vamos nos conhecer novamente" nada. Aí você nota que tem esperado sozinha. Esperado semanas e nem um sinal. Esperado semanas e nem a consideração de ter um sms respondido ou uma ligação atendida ou retornada. Nem isso, nem o mínimo. Nem o mínimo de comunicação pra acabar com todas aquelas esperanças que você tinha, mas sabe que não devia ter. E por semanas você olhava a lua na praia e lembrava dela. Por semanas dormia feito criança pequena com aquele bichinho de pelúcia que tinha sido presente dela, pra ter um pedacinho que seja daquele corpo que te dá tanta saudade perto de você. Por semanas não aguentou passar naquele bar que vocês iam sempre, olhar aquela mesa que era de vocês e se engasgar de saudade.Depois de um estalo, parece que dois anos não foram nada. Ou que só foram alguma coisa pra você.
Ela não é mais minha. E foi escolha dela. Eu ainda era dela, mesmo depois de ter passado por tantas mãos, tantas camas.E de repente, depois de um estalo depois de cochilar, o que resta é apagar todo o resto daquelas mensagens antigas no celular que você guardava pra reler quando não conseguia dormir. Quem sabe agora eu tenha um mínimo que seja de paz.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Um encontro casual qualquer

Engraçada essa coisa que uns chamam de “leis que regem o universo” e engraçado como essas leis que regem a vida humana são espiralares. O tempo passa e as mesmas coisas, uma hora ou outra, vão evoluindo, mas em algum ponto, se repetindo. Digo evoluindo porque dificilmente com o passar desse tempo as coisas regridem. Ou estagna-se, ou evolui-se.

Dia comum, sol alto. Aquele sono depois de um almoço e eu quase dormindo enquanto escutava alguma coisa de bossa nova baixinho. O celular toca, uma amiga antiga. Falei rápido, soltei o celular em qualquer lugar e voltei pro travesseiro. O celular toca novamente e eu com aquela preguiça felina de abrir os olhos, por um momento não quis atender achando que era a mesma amiga pra pedir outra informação. A consciência pesou, abri os olhos com o resto da disposição que uma amizade de mais de 10 anos deixava, catei o telefone debaixo da cama, olhei para a tela. Olhei e levantei num salto, num susto rápido. Ele me ligava. Ele. Era, era ele e não retornava nenhuma ligação minha. Tanto tempo e era uma ligação dele.

Atendi. Ele perguntou se estava ocupada, disse que estava na cidade, que resolveria umas pendências e pediu pra que eu fosse à universidade encontrá-lo. Falei a ele que resolvesse as pendências e que me ligasse após, se ainda desse tempo de nos vermos. Ele pediu para que eu fosse de qualquer forma.

Fui.

Aquele ritual de sempre, abrir o sorriso, escolher roupa, sapatos, brincos, perfume.

Encontrei-o. Um abraço, dois sorrisos, “que saudade, como anda?”. Durante um segundo tudo de três anos antes passou como um filme na cabeça e olhei para ele estática. Eu me olhava no espelho e era outra pessoa. Ele, ainda tinha o mesmo rosto, o mesmo sorriso, o mesmo corte de cabelo, usava o mesmo perfume, os mesmos óculos. O cheiro da pele, não o cheiro do perfume, aquele cheiro só dele, da pele dele, foi a parte mais desconcertante quando, no abraço, me aproximei do seu pescoço.

Andamos para resolver as coisas dele com conversas normais de dois amigos que não se viam há tempos. Ele perguntou como havia sido minha viagem. A parte engraçada é que ele me tem com algum “soro da verdade”, onde parece que só ele consegue me descobrir sem que eu diga uma palavra. Em uma risada, ele descobriu como foi toda a viagem. Só tive o trabalho de contar uns poucos detalhes, enquanto ele repetia rindo o que sabia que eu havia feito em duas semanas longe. Parece que demoramos umas horas para adaptarmo-nos que éramos nós. Mas a cada assunto conversado, os dois sabiam que não éramos dois amigos, era bem mais, mas ao mesmo tempo não éramos nada. Cada “eu me lembro disso” que falávamos deixava isso bem claro. As coisas ficam no ar sozinhas. E a gente sempre sente.

Eu precisava ir, tinha o tempo contado, ele andou até o ponto comigo. Outra parte estranha era o fato de evitar nos tocarmos, não sei responder por que. Mas simplesmente não nos tocamos depois daquele primeiro abraço, a não ser quando ele, timidamente segurou o meu braço para evitar que eu distraidamente atravessasse a rua na frente de um carro. Devo dizer que isso me valeu a tarde, de certa forma.

Sentamos na grama pra esperar a minha hora, ainda assim evitando até mesmo nos olharmos diretamente. Ofereci uma pastilha, como de costume, já que tenho a mania de andar com algumas sempre na mochila –“dessa vez eu aceito!”. Ainda lembrava-se da minha mania antiga, mesmo sem nunca ter aceitado das vezes que ofereci.

Comentei sobre o final do meu relacionamento com outra pessoa. Ele, de forma desconcertada também, me falou que andava namorando. Não sei se ele chegaria a comentar sobre comigo se eu não tivesse falado de mim antes. O coração ficou apertadinho e eu fingi um sorriso de que ficava feliz por ele. Também não fiquei tão mal assim. Somente fiquei me perguntando por que ele quis passar a tarde comigo, quando podia estar com a namorada (se bem que ela estava na aula), enfim. Um conhecido dele passou, puxou conversa, nesse meio tempo meu transporte chegou. Levantei às pressas, dei-o um abraço rápido e disse que estava indo. - “Te ligo depois pra gente marcar algo com mais calma!” –“Liga, liga sim!” e corri para não perder a hora. Enquanto o carro manobrava, percebi que ele prestava atenção e sorria doce de longe, mesmo não conseguindo me ver da parte de dentro por causa dos vidros escurecidos.

Mais uma ligação, mais um encontro, mais desses sorrisos, que talvez não queiram dizer nada, que não trazem a promessa de nada, mas que deixam aquele sentimento de que não foi a última vez. Aquele sentimento de que não é só isso, mas é algo bem distante, quase irreal, eu diria, se não o conhecesse tão bem, talvez melhor que qualquer um.

História curta, besta, simples, banal, desinteressante. Dessas coisas que passam quase despercebidas, mas que ficam martelando na cabeça um dia ou dois e só, que talvez a gente nunca entenda, mas que com certeza, em algum ponto da vida, vão se repetir. Evoluídas ou estagnadas, mas vão. Tenho certeza disso. São também esses reencontros que regem a nós e o universo.

sábado, 29 de outubro de 2011

Os novos tijolinhos

Aí você decide: vida, quem manda nisso aqui agora sou eu, ta bom? Eu. Ouviu?

Você enxuga os olhos, seje homem! desamarrota as roupas, estala todos os ossinhos enferrujados do comodismo de ficar parada no mesmo canto durante tanto tempo, pega o mapa e prepara a trajetória. Caminho escolhido. Tudo bem, só rumar agora.

Anda, anda, anda. Eu que mando, eu decido.

Aí, você sente um cheiro doce no ar e se distrai na caminhada porque ele te traz umas lembranças antigas. E nem nota que a vida tava escondidinha numa moita de mato seco disfarçada de cascavel. Ainda balançava o chocalho pra fazer barulho só de brincadeira com a sua cara. Ela sabia que você não ia prestar atenção mesmo.

Aí você continua andando distraída com o cheiro pela nova estrada de tijolos amarelos escolhida. E então, aquela dor aguda, o sangue escorrendo pelo tornozelo, aquele gritinho de susto. Aí você olha pros lados e vê a vida-cascavel que te deu um bote e ta ali, rindo de você.

- Eu não disse que agora EU escolheria?

- É, minha velha, disse. Pense bem, querer não é poder. Olhe bem na sua frente esses tijolos amarelos. Olhou o mapa até o final? Não? Não consegue ver o final completo, não é mesmo? Fui eu que o desenhei. Olhe mais em frente, vê ali o resto do caminho? Oras, deixe de ser criança e tire essa fita dos seus olhos, todo caminho tem lindos tijolinhos dourados no começo, a gente coloca eles lá e nem presta atenção. Vê que você não pode fugir do que já foi traçado. Já escolheu um caminho, não foi? Pois bem, siga com ele até o final, não dá pra voltar e começar tudo de novo. Eu só dou as canetas, não as borrachas, não dá pra apagar. Tirou a fita? Agora olhe bem em frente pro lugar que você está tentando ir agora. Presta atenção, ele termina no mesmo lugar que o seu primeiro caminho, fugir não adianta. Você só vai demorar mais pra chegar no destino final, vai encontrar mais espinhos pra rasgar o vestido, e mais lama pra sujar essas sapatilhas, somente. O final, você já escolheu, se lembra?

Oras, eu sei, a mordida doeu. Sempre dói quando eu mordo, pare de reclamar e deixe de ser menina chorona. É pra ver se dessa vez, você abre os olhos, coopera comigo e deixa de fugir.

sábado, 22 de outubro de 2011

Fotografia

Persuasiva?

Persuasiva era apelido.

Ela era um animal e só descansava quando conseguia o que queria. Podia perder a graça, mas ela só descansava ao ver o plano em prática. Se perdesse o gosto, pouco importava, guardava o que tinha conseguido feito um troféu num armário mental e se auto-gabava de todas as coisas em silêncio. Às vezes era rasteira feito uma cobra, mas andava em cima dos espinhos feito um gato. Ser deselegante nunca. A vida se desenrolava e ela só sambava em cima dos cacos de vidro.

As verdades eram suas e somente suas, sabia manipular as situações como quem manda em uma marionete. Palavras, idéias, tudo era brinquedo naqueles lábios naturalmente tingidos de vermelho brilhante, como os de quem já acorda de maquiagem. Nos lábios e nos dedos quando segurava um lápis, longos e rápidos feito os de uma pianista, como se tivessem sido projetados assim pra acompanhar a velocidade dos raciocínios felinos. O mundo era dela, porque era ela quem o construía.

Pra ajudar a construir os castelos, ainda tinha aquele rosto bem branco, bochechas rosadas de boneca e cabelos assanhados de criança. Ganhava credibilidade quando falava por causa da inocência do jeito infantil e desleixado. E ela sabia muito bem como se aproveitar disso. O grande deslize de qualquer um que a acabasse de conhecer era não prestar atenção no olhar desconfiado da leoa, somente no sorriso aberto e na risada longa que soltava facilmente sem pudores.

Aquele sorriso no canto da boca era um inferno.

O perfume de flor, os cabelos despenteados e o sorriso no canto da boca faziam o inferno.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Rotina

(uma tarde inteira de sangue, suor e lágrimas)

...

(a outra questiona)
- ... então você ficou me esperando todo esse tempo e...
(ela grita num salto)
- Eu podia ter me casado!
(a outra pega a bolsa na cadeira, faz cara de choro e levanta)
- Certo, eu já entendi o que você quer dizer com isso.
(ela segura forte o braço da outra, acende um cigarro)
- ... você vai mesmo?
(mais silêncio, nenhum olhar, a outra continua em pé quase chorando)
(ela solta o braço da outra)
- tá livre, a decisão é sua.
(a outra continua em pé de cabeça baixa; ela fala quase sem abrir a boca)
- senta.
(termina o cigarro, pede uma garrafa d'água)

...

(surpreendentemente, a outra fala)
- Sabe o que eu queria agora?
- ?
- dormir abraçada contigo...
- Então vamos pra casa.

...

(e mais uma noite sem dormir para as duas).

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Sexo e Regionalismos

Um dos maiores problemas do Brasil, esse nosso país continental, são os preconceitos linguísticos. Pra acabar com eles, sugiro aqui o que todo mundo gosta: sexo.

Eu nunca havia saido, sexualmente falando, de Pernambuco até as últimas semanas. Aí que eu sempre brincava com as amigas e amigos que fizeram sexo com gente de fora do estado e as expressões ouvidas na cama por eles. De uma amiga que transou com um baiano, era o conhecido “Vai, mainha!” ou o clássico “engole, minha nega!”; De uma outra que transou com um carioca, era num clima meio funk: “Sua cachorra gostosa!”; Com um amigo que namorava um mineiro era “Gatão, seu trem bão!”; Teve o paulista e o tradicional “Mano, como você é boa!”; o Gaúcho e o “Bah, você usa a boca muito bem!”; O de Santa Catarina que transou com um amigo meu disse “Nossa, os alemão aqui não tem um pau desse tamanho!” eles se chamam de alemão porque são loirinhos dos olhos claros e meu amigo é moreno, então já viram, né?; Ainda teve o paraense que soltou um “égua, como você é firme!”; o cearense que diz “Maxo, vamo dedicar!” (lembrando que dedicar é transar); entre outras expressões já ouvidas por aí que eu não lembro.

Aí que aconteceu: fui prum congresso e resolvi tirar um tempinho a mais de férias em Goiás, o que me levou a conhecer um goiano gato e fofíssimo, um doce de menino. Recomendo-o a todas as amigas que forem pra Goiás, porque não se monopoliza coisa boa (na verdade se monopoliza, mas ele tá a 2.330km daqui, então aproveitem ele se forem por lá) numa festa que estava rolando, e que eu não faço idéia de como o conheci, porque, pra variar, estava bêbada. Então, num dado momento, rolou aquela de sempre: a gente se beijou na festa, etc, etc, ele me puxou pela mão e me levou a algum lugar. Eu fui sem questionar nem reclamar, queria qualquer coisa que ele estivesse planejando mesmo, e tratando-se de um homem, era bem obvio onde eu ia terminar. E quando dei por mim, estava na cama dele (na cama, no chão, em pé, na cama do amigo, no colchão, na varanda... enfim, né). Aí, umas várias horas de sexo depois, eu estava me dedicando pra fazer o melhor que podia no sexo oral, já que eu estava bêbada e tinha perdido grande parte da coordenação motora, e ele solta um “uai!”, num sotaque bem goiano

U

A

I

Eu parei o que estava fazendo no mesmo instante e dei uma risada imensa. Gente, eu não estava rindo por causa do uai, é claro, estava rindo porque foi MUITO bonitinho. Ainda tive a cara de pau de perguntar “como é que é? Uai?” e de pedir pra ele repetir mais uma vez (apesar de que também havia pedido pra ele repetir coisas como “porrrrrrteira” e demais palavras com o R retroflexo).

Dias depois, já no congresso, eu o troquei pra ir fazer a social com uns amigos que não via tinha mais ou menos um ano. Aí que eu passei a tarde bebendo e fumando com a galera e deixei o goiano meio de lado. Terminou que outra chegou, foi mais esperta, não bebia, não fumava e levou o boy. Deve ter aproveitado bastante (eu, no lugar dela, teria). Não que eu não tenha aproveitado com outras regiões também, né? Não sou obrigada, só soube ser discreta, mas isso já é assunto pra outra hora.

No final das contas, acho que sectarizamos demais as regiões e fazemos sexo de menos. Tá na hora de mudar isso aí. Vai ser bem mais prazeroso pra todo mundo.